Pesquisas e Relatos

Travessia Alpha-Ômega/ Serra do Marumbi, PR

Nos dias 13,14 e 15 de julho de 2018 eu e a minha parceira de travessias Idce Sejas realizamos a lendária travessia Alpha-Ômega, na Serra do Marumbi (PR). Antes de iniciar a travessia ouvíamos falar que a questão da navegação no percurso é o que torna esta travessia tão desafiadora, além disso, passa-se por diversos cumes. A quilometragem total da trilha é de cerca de 20 km, e nos perguntávamos o motivo pelo qual se gasta três dias para fazer a travessia com cargueira, enquanto, por exemplo, na travessia Araçatuba X Crista, de quase 60 km, se gasta o mesmo tempo. Já no primeiro dia obtivemos a resposta para este questionamento.

 

Considerações iniciais

 

Travessia Alpha-Ômega. Organizado por: Yara de Mello, 2018.

A Idce é uma montanhista curitibana e faz algum tempo que esta travessia se tornou um sonho para ela. Eu entrei de gaiato nesta empreitada, porém, agora que passou posso dizer que foi meu maior desafio até então no montanhismo e simplesmente me apaixonei por esta experiência. Gostaria de agradecer as pessoas envolvidas e que não puderam participar do desafio: Marina Sutilli e Allan Araujo; e também ao pessoal envolvido na logística: Paulo Mengue, Irys Nasser e Danilo Vidal Blasi.

Lamentamos ter encontrado lixo pelo caminho, desde garrafa pet, a lenços, sacola com lixo e pedaço de isolante térmico. Devemos respeitar este ambiente, sabemos que acidentes acontecem, mas mais atenção se faz necessário.

Esta travessia é proibida, com possível aplicação de multa caso os sujeitos sejam abordados ou caso necessitem de resgate oficial. É proibida, pois parte do seu trajeto está inserido em uma zona intangível do Parque Estadual Pico do Marumbi.

 

1° Dia – Morro do Canal X Vale entre o Mesa e o Alvorada 4

 

Iniciamos a caminhada umas 6h30 min do dia 13 de julho de 2018 pela trilha que dá acesso ao cume do Morro do Canal (1340 m). Por volta de 7h50 min atingimos o cume do Canal, este trecho da trilha é bem aberto. No trecho entre o Canal e o Vigia (1360 m) tem um paredão que até um tempo atrás precisava ser descido segurando apenas em uma corda, agora têm degraus, o que facilita muito. Na crista do Vigia precisa de atenção porque a trilha mais batida é a que segue para a Torre Amarela (1260 m). Seguimos até o Ferradura (1401 m) e depois até o Carvalho (1457 m), onde descemos até os destroços do avião. Por volta de 12h15min já estávamos no Sem Nome (1438 m), onde almoçamos. A trilha começou a ficar mais fechada depois do Vigia, e a partir do Sem Nome a trilha foi fechando mais ainda. Do Sem Nome descemos um grande declive e depois subimos o vale, atingindo o (Mesa 1413 m) por volta das 14 horas. Lembrando que entre cada um destes cumes descemos e subimos vales com vegetação fechada. No cume do Mesa tem sinal de celular e visual, nos cumes do Carvalho e Sem Nome não tem visual. Atingimos o fundo do vale entre o Mesa e o Alvorada 4 próximo às 15 horas, tem um rio neste local. A área de camping é bem úmida, e encontramos uns dois locais possíveis para colocar a barraca. Nesta área o sinal do GPS se perde.

 

2° Dia – Vale entre o Mesa e o Alvorada 4 X Vale entre o Pelado e o Ângelo

 

Iniciamos a caminhada por volta das 8h45min, no início da trilha tem bastante taquara e é bem fechado, precisa de atenção. A subida para o Alvorada 4 é bem íngreme, lembrando que é preciso encher os cantis de água antes de sair do acampamento. A pior parte da navegação com GPS que havíamos lido em outros relatos é entre o Alvorada 2 e a base do Espinhento, estávamos com um pouco de receio neste trecho. E de fato a previsão se confirmou, é um percurso longo de cerca de 2 km que exige muita atenção para não se perder. Foi um alívio vencer esta etapa. Do cume do Pelado (1510 m) foi a primeira vez durante a travessia que conseguimos avistar o Olimpo (1539 m). De lá ainda é possível avistar diferentes montanhas, as quais conseguimos ver de outros pontos da travessia, como a Pedra Branca do Araraquara (1222 m), o Araçatuba (1673), Pico Paraná (1877), Ciririca (1705 m), Agudo da Cotia (1464 m), Morro do Sete (1359 m) e a serra da Farinha Seca bem ao lado. A subida do Pelado é bem íngreme. Destaco ainda que dos Alvoradas (4, 3 e 2) o Alvorada 3 é o que apresenta a melhor vista. Chegamos à asa do avião abaixo do cume do Pelado por volta das 15 horas. Iríamos acampar neste ponto, cheguei a tirar as coisas de dentro da minha mochila, e fomos pegar água num ponto de rio cerca de 5 minutos para baixo no sentido da trilha da Freeway, quando chegamos lá o rio estava seco, ou seja, deve-se cuidar com este detalhe nos períodos mais secos do ano. Como tínhamos pouca água decidimos descer até o vale entre o Pelado e o Ângelo e torcer para ter algum ponto com possibilidade de montar a barraca lá embaixo. Foi o que ocorreu, tinha um rio com bastante água e um ponto onde cabia uma barraca (antes do rio um minuto + ou -). Na descida para este vale a trilha é bem fechada com taquara por um longo período. Tem um momento que a trilha batida se perde, basta procurar um pouco, à esquerda esta a continuação da trilha.

 

3° Dia – Vale entre o Pelado e o Ângelo X Estação Marumbi

 

Neste último dia a trilha já inicia com uma subida de mais de 200 metros. Iniciamos a caminhada umas 7h45min e chegamos ao cume do Ângelo (1552 m) por volta das 9 horas, estre trecho da trilha é bem bonito, assim como a descida do Leão (1566 m)/ ponto culminante da Alpha-Ômega para o Boa Vista (1491 m). Depois seguimos para a Pedra da Lagartixa, Olimpo (1539 m) e Gigante (1478 m). Descemos até a Estação Marumbi pela trilha noroeste, a qual foi aberta entre os anos de 1938 e 1940. Chegamos à casa do Clube Paranaense de Montanhismo (CPM) na vila antes das 17 horas, cheias de hematomas no corpo (hahahah), acabadas, morrendo de sede, pois estávamos sem água desde o cume do Olimpo, mas ao mesmo tempo o sentimento de conquista, realização, etc. etc. era muito grande. Este último dia de caminhada é bem puxadinho, na crista a caminho do Olimpo têm uns lances que exigem bastante esforço, lances de exposição mesmo.

 

Considerações finais

 

Achamos a travessia desafiadora, além de saber usar o GPS é importante ter uma noção de rastreamento de trilha sem o uso deste equipamento. Têm fitas ao longo da travessia – o que ajuda muito, mas atenção, que às vezes elas indicam outro caminho. Sobe, desce, entra em mata fechada, engatinha, pendura, sobe corda, desce degraus, etc. São muitos desafios, a coluna, as pernas, o corpo de um modo geral pede arrego… Mata fechada, taquara, bromélias pontudas, vales, cumes, vales cumes… Não nos perdemos, o que foi muito bom, em vários pontos precisamos procurar a continuidade do traçado, porém com calma e cautela acabávamos encontrando. Precisa de MUIITTA atenção a trilha toda, o que acaba sendo um desgaste mental também. O tempo estava perfeito em todos os dias da travessia, estávamos sob a ação de uma massa polar que ao longo do tempo foi se tropicalizando.

Tendo em vista que esta travessia é PROIBIDA por estar em partes inserida em uma zona intangível (proteção ambiental altamente restritiva) do parque, e que seu percurso é difícil, tanto em relação à navegação quanto em relação ao esforço físico, espera-se que as pessoas que se arrisquem a realizar este percurso tenham a consciência de respeitar este ambiente. NÃO DEIXAR LIXO pelo caminho, não destruir a fauna e flora, enterrar as fezes, não deixar papel higiênico jogado no chão, são todas atitudes essenciais para um montanhista com o mínimo de respeito por si próprio, pelo próximo, pela natureza e pelos que lá habitam.

 

CUMES:

  1. Canal
  2. Vigia
  3. Ferradura
  4. Carvalho
  5. Sem Nome
  6. Mesa
  7. Alvorada 4
  8. Alvorada 3
  9. Alvorada 2
  10. Pelado
  11. Ângelo
  12. Leão
  13. Boa Vista
  14. Olimpo
  15. Gigante

 

Clique sobre as imagens para visualizar melhor

 

Subida ao Morro do Canal. Foto: Yara de Mello, 2018.
Torre Amarela. Foto: Yara de Mello, 2018.
Torre da Prata. Foto: Yara de Mello, 2018.
Morro do Canal. Foto: Yara de Mello, 2018.
Acampamento 1. Foto: Yara de Mello, 2018.
Bloco de granito. Foto: Yara de Mello, 2018.
Árvore na trilha. Foto: Yara de Mello, 2018.
Mata. Foto: Yara de Mello, 2018.
Vista a partir do Alvorada 3. Foto: Yara de Mello, 2018.
Espinhento. Foto: Yara de Mello, 2018.
Acampamento 2. Foto: Yara de Mello, 2018.
Vista a partir do Pelado. Foto: Yara de Mello, 2018.
Primeira vista do Olimpo. Foto: Yara de Mello, 2018.
Bandeirantes. Foto: Yara de Mello, 2018.
Serra da Farinha Seca. Foto: Yara de Mello, 2018.
Cume do Ângelo. Foto: Yara de Mello, 2018.
Morro do Sete. Foto: Yara de Mello, 2018.
Olimpo visto da Pedra da Lagartixa. Foto: Yara de Mello, 2018.
Olimpo e Pico Paraná ao fundo Foto: Yara de Mello, 2018.
Visual do Olimpo. Foto: Yara de Mello, 2018.
Olimpo. Foto: Yara de Mello, 2018.
Nós no cume do Olimpo.
Descida pela trilha noroeste (Esfinge ao fundo). Foto: Yara de Mello, 2018.
Abrolhos visto da Estação Marumbi. Foto: Yara de Mello, 2018.

 

Referências:

ALVES, N. L. P. As montanhas do Marumbi. Curitiba: Edição do Autor, 2008. 480 p.

STRUMINSKI, E. Parque Estadual Pico Marumbi, caracterização ambiental e delimitação de áreas de risco. Dissertação (Mestre em Engenharia Florestal). Universidade Federal do Paraná, 1996.

http://montanhaativa.blogspot.com/2017/04/travessia-alfaomega-por-ander-paz.html

http://www.tmtrekking.com.br/travessia-alpha-omega-agosto2015/

 

 

 

 

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