Pesquisas e Relatos

Comparativo da altimetria entre travessias de montanhas no Brasil

Existe uma discussão recorrente sobre qual a travessia de montanhas mais difícil do Brasil. A resposta para este questionamento é relativa, pois cada organismo responde de uma forma ao ambiente e as condições que este impõe, e as condições mudam de acordo com o tempo meteorológico e cronológico…

 

Introdução

 

Existem particularidades que possibilitam uma hierarquização das travessias mais difíceis de uma forma generalizada, por exemplo: distância percorrida, subida acumulada, mata mais fechada e dificuldade de orientação. 

 

O objetivo deste post é fazer uma comparação da subida e descida acumulada e da distância entre algumas das travessias de montanhas do Sul e do Sudeste brasileiro, utilizando métodos comuns, com o intuito de auxiliar nesta discussão comparativa do grau de dificuldade de algumas das principais travessias brasileiras.

 

O cálculo da altimetria acumulada (ganho/subida e perda/descida) apresenta diversos erros entre os diferentes métodos aplicados. Se você for fazer um comparativo da mesma trilha no Google Earth, Wikiloc e Garmin BaseCamp cada um irá apresentar um valor diferente, apesar do gráfico do perfil de elevação ser muito similar.

 

E se você usar o track com a quantidade original de pontos de trilha e o simplificado também existe uma diferença. O simplificado parece apresentar melhores resultados.

 

Pegando o track da travessia Araçatuba  X Monte Crista temos:

Fonte Subida acumulada Descida acumulada
Wikiloc 2.318 m 3.193 m
Google Earth 2.444 m 3.330 m

Garmin BaseCamp (original 5.027 pontos)

3.061 m 3.944 m
Garmin BaseCamp (simplificado 500 pontos) 2.494 m 3.380 m

 

Neste caso, os valores mais aproximados entre si foram do Google Earth e do Garmin BaseCamp com os pontos de trilha simplificados.

 

O método menos acurado, segundo este site é a utilização dos pontos de trilha do GPS unicamente, a utilização de um Modelo Digital de Elevação (MDE) é um pouco mais acurada, mas ainda apresenta erros. O Google Earth calcula as altitudes com base em informações de MDE, com isso, seria mais acurado do que o cálculo tradicional de uma trilha com todos os pontos realizado no Garmin BaseCamp.

 

No site citado acima, GPS VISUALIZER, eles disponibilizam uma ferramenta na qual você carrega sua trilha de GPS original e ele faz um ajuste da sua track com base em um MDE e outras informações, depois gera um novo arquivo GPX onde você poderá abrir no BaseCamp, por exemplo.

 

Na análise do ganho e perda de altitude dos tracks das travessias avaliadas neste estudo foram utilizados diferentes métodos, GPS visualizer, Garmin BaseCamp e Google Earth. Também foram utilizadas diferentes tracks do mesmo percurso, com pontos simplificados e com a quantidade original. Em alguns casos foram gerados mais de 6 perfis de elevação para que fosse feito um comparativo entre os modelos.

 

Cheguei a mesma conclusão que outras pessoas já tiveram, como pode ser visto em algumas discussões em fóruns na internet, não existe um método 100% acurado, e os valores podem variar muito. Desta forma, não utilize os resultados desse estudo como verdade absoluta. 

 

Destaco que não analisei a travessia Alpha Crucis e nem a Transmantiqueira, que são a junção de mais de uma travessia. 

 

Comparativo

 

A tabela abaixo mostra em ordem decrescente a subida acumulada de cada uma das travessias analisadas. Na última coluna tem algumas observações com base na minha experiência nessas travessias e em relatos. 

 

A travessia com a maior subida acumulada é a Ferraria X Marco 22, no Paraná.

 

Em seguida vem a Araçatuba X Monte Crista e Serra Fina, a altitude acumulada dessas duas travessias variou bastante, utilizei o valor mediano. É difícil saber qual das duas vem na sequência da Ferraria X Marco 22.

 

Comparativo da subida acumulada de diferentes travessias de montanha no Brasil. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Em relação a descida acumulada, a travessia com o maior desnível é a Araçatuba X Monte Crista, seguida pela Ferraria X Marco 22 e Serra Fina, conforme tabela abaixo.

 

Comparativo da descida acumulada de diferentes travessias de montanha no Brasil. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

A travessia com a maior extensão é a Araçatuba X Monte Crista, seguida pela travessia do Campo dos Padres e Ferraria X Marco 22.

 

Comparativo da distância acumulada de diferentes travessias de montanha no Brasil. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Deve-se levar em consideração os trechos de mata fechada e a dificuldade na orientação para mensurar o quão difícil é realizar cada uma dessas travessias. Nesse quesito eu destacaria as travessias: Alpha-Ômega, Ferraria (face leste) X Marco 22, Bolinha X Marco 22 – por cima, Serra da Farinha Seca, e Serra do Tabuleiro. Outra questão importante é o tipo de solo, por exemplo, na travessia do Campo dos Padres tem longos trechos de solo encharcado e isso é muito cansativo.

 

Na minha opinião os itens dificuldade de orientação, trechos de mata fechada e solo encharcado/turfeiras são tão significativos ou mais do que o acumulado de subidas, e principalmente das distâncias acumuladas.  

 

Essas travessias são mais desafiadoras, porque além do cansaço físico também tem o mental durante e antes da travessia . Já tive a experiências de guiar alguns grupos para montanha e penso que o peso de guiar um grupo na travessia da serra da Farinha Seca seja bem maior do que na Serra Fina, por exemplo.

 

Com isso, eu arriscaria dizer que a travessia mais difícil dentre as analisadas é a Ferraria (face leste) X Marco 22. Porque além de ter um alto valor de subida, descida e distância acumulada, tem dificuldades de orientação e trechos de mata mais fechada. 

 

Em sequência viria o grupo de travessias com maiores desafios na orientação e com trechos de mata fechada: Alpha-Ômega – por cima, Bolinha X Marco 22 – por cima e Serra da Farinha Seca.

 

Depois o grupo de travessias com altos valores de altimetria acumulada e extensão do trajeto: Campo dos Padres, Araçatuba X Monte Crista e Serra Fina. Destacaria ainda a travessia da Serra do Tabuleiro, que tem diversos trechos com mata mais fechada.

 

Perfis altimétricos das travessias

 

Na sequência estão disponíveis figuras com perfis altimétricos das travessias analisadas neste estudo. Todos os perfis foram desenvolvidos no Garmin BaseCamp. Com eles é possível ter uma noção dos desafios de subidas e descidas de cada uma das travessias.

 

Observação: Nesta análise pude perceber que as altitudes variam bastante entre os modelos, mas a amplitude nem tanto. Em resumo, a forma dos gráficos é mais fiel do que os valores altimétricos neles representados. Os pontos “culminantes” destacados no gráfico se referem aos pontos culminantes em que o trajeto utilizado passou.

 

Travessia Ferraria (face leste) X Marco 22

 

A travessia Ferraria X Marco 22 está localizada nos municípios de Antonina, Campina Grande do Sul e Morretes, no estado do Paraná.

 

Perfil altimétrico da travessia do Ferraria X Marco 22. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Travessia Alpha-Ômega – por cima

 

A travessia Alpha-Ômega está localizada nos municípios de Piraquara e Morretes, no estado do Paraná.

 

Perfil altimétrico da travessia Alpha-Ômega, com destaque para o seu ponto culminante. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Bolinha X Marco 22 – por cima

 

A travessia Bolinha X Marco 22 está localizada nos municípios de Campina Grande do Sul, Antonina e Morretes, no estado do Paraná.

 

Perfil altimétrico da travessia Bolinha X Marco 22. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Travessia da Serra da Farinha Seca

 

A travessia da serra da Farinha Seca está localizada nos municípios de Quatro Barras e Morretes, no estado do Paraná.

 

Obs.: Eu não sei se o ponto culminante desta serra é o morro Mãe Catira (1.436 m) ou o Tapapuí (aprox. 1.435 m/ fonte: Open Street Map). Mas em ambos os picos é possível fazer um ataque durante a travessia. O track abaixo não passa pelo Mãe Catira.

 

Perfil altimétrico da travessia da Serra da Farinha Seca. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Campo dos Padres

 

A travessia Campo dos Padres está localizada nos municípios de Alfredo Wagner, Bom Retiro, Anitápolis e Urubici, no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia do Campo dos Padres, com destaque para o seu ponto culminante. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Araçatuxa X Monte Crista

 

A travessia Araçatuba X Monte Crista está localizada nos municípios de Tijucas do Sul e Guaratuba no estado do Paraná, e em Campo Alegre e Garuva no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia do Araçatuba X Monte Crista, com destaque para o seu ponto culminante. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Serra Fina

 

A travessia da Serra Fina está localizada nos municípios de Passa Quatro, Itanhandu e Itamonte no estado de Minas Gerais, Lavrinhas e Queluz no estado de São Paulo, e Resende no Rio de Janeiro.

 

Perfil altimétrico da travessia da Serra Fina. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Serra do Tabuleiro

 

A travessia da Serra do Tabuleiro está localizada nos municípios de São Bonifácio, Santo Amaro da Imperatriz e Águas Mornas, no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia da Serra do Tabuleiro. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Petrópolis X Teresópolis

 

A travessia Petrópolis X Teresópolis está localizada nos municípios de Petrópolis, Magé, Guapimirim e Teresópolis, no estado do Rio de Janeiro.

 

Fiz essa travessia com o grupo Cachorro do Mato.

 

Perfil altimétrico da travessia Petrópolis X Teresópolis. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Pedra da Tartaruga X Monte Crista

 

A travessia da Pedra da Tartaruga X Monte Crista está localizada no município de Garuva, no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia da Pedra da Tartaruga X Monte Crista. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Pedra da Tartaruga X Morro Garuva

 

A travessia da Pedra da Tartaruga X Morro Garuva está localizada no município de Garuva, no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia da Pedra da Tartaruga X Morro Garuva. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Morro Garuva X Monte Crista

 

A travessia do Morro Garuva X Monte Crista está localizada no município de Garuva, no estado de Santa Catarina.

 

Perfil altimétrico da travessia do Morro Garuva X Monte Crista. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

 

Marins X Itaguaré

 

A travessia Marins X Itaguaré está localizada nos municípios de Piquete e Cruzeiro no estado de São Paulo, e Marmelópolis e Passa Quatro no estado de Minas Gerais.

 

Perfil altimétrico da travessia do Marins X Itaguaré. Elaborado por: Yara de Mello, 2019.

Concluindo…

 

Essa hierarquização da dificuldade de travessias vai variar muito de pessoa para pessoa. Com o tempo travessias que eram difíceis vão ficando mais fáceis, porque um maior número de pessoas frequentando os trechos de mata vão deixando a orientação mais óbvia e a caminhada menos exigente.

 

O cálculo da altimetria acumulada é um problema e esses perfis de elevação das trilhas são apenas satisfatórios. 

 

As pesquisas não servem apenas para mostrar que um método é eficaz ou o melhor, mas também para mostrar seus pontos negativos ou mesmo sua inutilidade.

 

Fonte:

https://www.gpsvisualizer.com/tutorials/elevation_gain.html

 

 

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